sábado, 14 de dezembro de 2013


Entre besos

Mais um dia...e a esperança
queimou vagarosamente
na lareira do crepúsculo.
E o sinal que aguardei
E não chegou.
E sufoquei tua imagem
Entre minha boca e outra boca que beijei.
E te asfixiei em outros lábios que arderam
E te afundei em línguas movediças como as ondas,
E te tirei o direito de respirar em meu pensamento...
E te fiz naufragar nesse beijo alheio...
Amor...
hasta que vás a morir,
hasta que te pierdas tan hondo...
que no le encontres más dentro de mi.

(Marcia Pfleger)


segunda-feira, 2 de dezembro de 2013



"E tudo que escrevo, escrevo para ferir teus ouvidos, para que sangres, por dentro, de uma lágrima indizível, para que nunca mais esqueças o apito do navio partindo, o quebra-mar em arritmia, as conchas se esfarelando na areia. Tudo que escrevo, escrevo com a ponta de um espinho onde uma borboleta insana pousa. É um giz sem suavidade, uma unha que risca a lousa ".

(Marcia Pfleger)

OBS: Visitem a página "Unha que risca a lousa" no Facebook e curtam bastante! Abraços!

domingo, 24 de novembro de 2013



6 HAIKAIS
(Marcia Pfleger)

Salto

A águia salta
sem temer lá embaixo a pedra dura:
Não falta envergadura


Para Borges

Abertas ou cerradas as pálpebras
Dá no mesmo:
Só olhar pra dentro não é a esmo

(Homenagem ao grande escritor universal, Jorge Luiz Borges, que aos 50 anos ficou cego)

Teia

Vagalume se prende na teia:
A aranha
na cerca elétrica esperneia


Em mim

O choro que a chuva repete como bordão
Não se repete em mim:
Em mim, tenho este coração.

Placas

Siga em frente
Mas não brinque com esta figura:
Tem curva perigosa na minha cintura

Fôlego

De um só fôlego, seis haicais
Tá de bom tamanho
Ou ainda tem mais?




Defunto

Sem grinalda
E sem lira
Jaz na cova o olhar...
E o que era safira
Já parou de brilhar

De onde vinha
o que te aquecia?
O que te aquecia a
 carne, sangue, artérias...
Gozando agora
Irrevogáveis férias

Mas, e tu? Para onde?
Se o habitar desse invólucro
que tomo assunto
transita separado
do defunto?


sexta-feira, 22 de novembro de 2013



10 HAIKAIS

I

Balé de graça
no Pantanal se ensina:
a garça, em ponta, é bailarina

II

Dia triste na lagoa quando chove
Até o sapo cantando
se comove

III

Enxurrada de pipas
no azul total do céu:
as nuvens hoje são de papel

IV

Chove muito, treme a calha.
De tanto sacudir
parece que gargalha

V

A chuva na janela não passa:
descem formigas prateadas
pela vidraça...

VI

No álbum, a foto amarelada:
toda tarde na infância
é ensolarada?

VII

Entardecer cor de laranja.
Contra o sol a menina
arruma a franja.

VIII

Libélula de vidro,
contra a luz diviso
o seu colorido

IX

Amanhecer na praia, um tesouro:
o céu me sorri
com um dente de ouro...

X

Olhos abertos, sono chegando:
duas meninas
fecham as cortinas...


(Marcia Pfleger - todos do dia 22/11/2013, de um só fôlego...)

sexta-feira, 24 de maio de 2013



Reencontro

É estranho te encontrar agora...
Entre uma época e outra
haverá uma ponte?
Como é possível que o passado
nos alcance? Como é possível hoje
o que era ontem?

(Marcia Pfleger)




domingo, 5 de maio de 2013

Sobre exposições e mais um poema meu...

Neste domingo, fiz uso do dia e da boa companhia e fui visitar, no MON, a exposição de Escher (a qual já homenageara com um post no Face, há tempos). Achei interessante experimentar um certo olhar de caleidoscópio, que liberta o objeto de sua imobilidade e nos apresenta perspectivas inusitadas, conforme o ângulo de onde se olha.
Aproveitei e entrei na mostra do escritor paranaensíssimo Paulo Leminski, de onde saí inspirada, com meia dúzia de novos poemas pululando. Naquela atmosfera brumosa da exposição, marcada por grafitagem, fotos, colagens, vermelhos e sombras, para mim, não eram simplesmente os poemas que estavam no local, rabiscados nos murais: era como se o próprio poeta estivesse ali, esfregado na parede, eviscerado e desnudo.
Penso na facilidade com que as impressões me tocam, por mais díspares que sejam, e constato que meu termômetro é longo. Sou capaz de me comover com a mais tênue seda do espírito e, em outros casos... bem, eu e o Sr. Christian Gray faríamos uma festa! Assim, logo me chegou aquela sensação de fascínio quase orgástico que, no meu caso, precede a criação. Dessa influência, resultaram vários poemas, como o que apresento abaixo, embora sem a pompa e a circunstância de uma exposição...


In Versus

É sempre a outra face
Da mesma moeda:
Cara ou coroa
só depende da queda...

Deixe-me contar uma coisa
(ah, adoro sua cara de pasmo):
O ódio ainda é o amor,
Com outro tipo de entusiasmo

Então, nunca mais esqueça:
Uma coisa não deixa de ser,
Só por estar de ponta cabeça...

Vem cá, me beija na boca
E larga logo dessa besteira!
O ódio é apenas o amor
que resolveu plantar bananeira

(Marcia Pfleger - 05/05/2013)

quarta-feira, 1 de maio de 2013



Sobre “Uma Oração”, de Jorge Luiz Borges

(Jorge Luiz Borges era argentino, aos 50 anos ficou cego e é considerado um dos maiores escritores da literatura mundial. Morreu em Genebra, aos 87 anos).

Reli, dia desses, um belíssimo texto de Borges – Uma Oração – e não posso deixar de me sentir tocada, especialmente com seu final: o desejo do autor de morrer completamente, morrer integralmente, junto com o corpo e à maneira deste.
Esse mesmo desejo, de total aniquilamento , também está no poema “O Suicida”, quando diz:  “Morrerei e comigo irá a soma do intolerável universo”.
Não acredito que esse anseio expresse a vontade de um homem que cansou de viver ou que, em suas horas finais, desvalide as paixões que o moveram - seja por uma causa, seja por um livro, seja por uma mulher... A paixão é uma chama que se justifica e, pela sua própria natureza, uma forja da qual saímos transformados.
Essa aceitação de uma morte integral, mesmo ao completo aniquilamento, expressa em Borges,  não me parece voltada à autodestruição ou à busca do esquecimento da própria miséria humana. Talvez, antes, seja o desapego absoluto, asceta, pelo qual o homem é finalmente redimido. A suprema humildade de entregar-se ao que tiver de ser, mesmo que signifique o defrontar-se com aquela escuridão que a cegueira de Borges não poderia jamais igualar...Mas cujo mistério seu coração prenunciava.

(Marcia Pfleger – abril/2013)









domingo, 14 de abril de 2013






Que seja a fibra que dá gana,
me faça mergulhar fundo:
seja como barbatana.

Que seja brisa que me abana,
sussurre uma verdade:
seja a força que ela emana.

Que seja como estrada plana,
me faça chegar segura,
sem bússola ou traquitana.

Que me equilibre a forma insana,
mesmo que assaz assimétrica:
faça-me, então, ikebana...

(Marcia Pfleger - 13/04/2013.  Obs: Achei esta foto simplesmente linda!!!)

sábado, 23 de março de 2013




Quisera

Quisera dizer  quanto percalço percorri descalça, o quanto a cardíaca gota de sangue é choque, quisera lavar, deixar alva a alma, calma a palma, calva a mente, totalmente sem. Quisera apenas o miocárdio do meio-dia, que fosse exatamente assim, meu coração ensolarado, a pino.

Quisera esquecer-me por deveras tanto, quisera transmutar-me e me ver não mais no espelho, mas no poço de água que sou à sombra, neste poço de água à sombra, no qual eu sou...sombra.

Quisera uma fagulha de luz do dia. O dia é generoso, enquanto me acovardo e renego, porque a chispa luminosa vai se multiplicar no labirinto de espelhos que eu sou, buscando o minotauro que eu sou...mas que sempre me esconde de mim...

Quisera a liberdade ainda que tardia.
Ou a libertinagem que dá taquicardia.


(Marcia Pfleger)

sexta-feira, 15 de março de 2013

Divórcio

Tudo mudou, sem o menor conforto.
E a taça, tirada dos lábios num abrupto.
E os beijos cessaram, e o sol é morto.

(Marcia Pfleger - 2011)


domingo, 10 de março de 2013





OLHOS NO ESPELHO

Evito olhar-me nos olhos:
Não conheço esta que me encara 
E todo espelho é um abismo posto na horizontal...
Esta de aqui se pendura no sol da janela,
No jasmim que em horas vagas se insinua,
Na textura cambiante das pedras ao meio-dia...
Mais sombria é a que me contempla do espelho...
Perguntaria ela: de nós duas, quem é o joio, quem o trigo?
Ou contaria – para meu horror – que algo híbrido vingou
Neste solo úmido
De rancores, de amores...


(Marcia Pfleger)





sábado, 9 de março de 2013

Recordar é viver...Aí vai um pequeno revival de algumas coisas que escrevi na minha adolescência... Pessoalmente, gosto muito desta cantiga abaixo (in november/1986...).

Cantiga de Inverno

Cai a chuva, doce e contínua
num suave embalo de menina
cantando nas poças luminosas e frias,
enquanto a legião das nuvens, afora,
brinca serenamente no cinza que chora
brinca sem notar tanta melancolia

Vem a emoção passada das horas remotas
ao ver as folhas, travêssas, virar cambalhotas
na brisa que gira num estertor...
E borboletas exaustas procuram abrigo
Nas mãos românticas do galho amigo
que oferece entre os dedos uma flor

O vento vai levando a lembrança
dos tempos antigos, da alma mansa,
desmanchando as palavras pelo caminho.
E a saudade redobra ao ver entre o tumulto
as asas cansadas de um pássaro oculto,
que, como eu, aquece-se sozinho...

E, de repente, a solidão magoa
Se, então, o pássaro angustiado voa
e na distância também se some.
E então é brisa e chuva e canto
o murmúrio triste deste acalanto
que te procura a gritar teu nome...

(Marcia Pfleger - 1986)




sexta-feira, 8 de março de 2013

Acabo de abrir a caixa de avelórios e eis que as contas de vidro se revelam como um mantra. É hora de retirá-las novamente da caixa, e a caixa, da gaveta...  Qualquer hora, conto para vocês a história do homem sob o toldo vermelho... Por enquanto, deixo aqui os antigos poemas, de pedaços de mim (alguns) que já não existem.




Soneto XX
(Bucólico)

Canteiros verdes, floridos...uma cigarra...
É suave a tarde sobre os arados...
O vozerio dos pássaros, uma algazarra
ao sol que debulha grãos dourados

Recostada sobre a enxada, pensativamente
à névoa lilás do entardecer no horto,
caiu-me o coração - se fez semente:
a vida ressurgiu no peito morto.

Ser assim, sempre assim: verão na alma.
Regar na chuva as lágrimas desfeitas
Tê-las ressuscitado com pureza

E num pacto de amor à Natureza
ter, em estações de fúria ou calma,
mãos capazes para quaisquer colheitas.

(Marcia Pfleger, escrito em 1993)





O prisioneiro

Estudei o lugar
onde fora colocado.
O sol era minha bandeira na alta janela
e a raiva, a minha coragem.
O tempo passou e não teve jeito:
aos poucos, além do corpo,
a alma sente-se aprisionada.
E fica-se esperando não mais a oportunidade,
porém, o milagre.
O tempo corrói as verdades guardadas
e tudo parece
distante e obsoleto...
Um dia parece distante!
Dão-nos comida, água,
algum livro de versos baratos;
esqueceram de nós.
A janela, cada vez mais alta e mais estreita.
Dão-nos comida, água,
um dentifrício, e
que importa?
A bílis se apodera de todas as minhas partes.
As mãos emboloram no suór do medo.
Medo.
Medo de quê?
De não mais sair,
de não mais gritar,
de não mais se ouvir!
A voz paralisada
de um simples operário
é uma gangrena
corroendo, amortecendo a si próprio.
Quem compreenderia este ópio terrível?
A quem poderia falar
do que representa a liberdade para mim?
E o que antes me fazia caminhar
hoje lembra o meu aleijamento...
E acho que fiz um grande estrago em mim mesmo
e não atingi sequer uma janela
do castelo de monstros
contra o qual me erguera.

Meus olhos inchados de escuridão...
Minha boca quente de silêncio...
O cabelo ralo e os braços finos como lanças;
quem dera pudesse com eles
trespassar o escudo dos carrascos,
fugir para a alvorada, mesmo tiritando,
mesmo comendo das lixeiras,
aprendendo com as moscas e os ratos
no momento em que a sobrevivência
transforma o homem em qualquer coisa.

Sonho agora com uma
pequena
liberdade: a minha.
Por isso, fracasso com meus amigos,
fracasso com minha luta
mas não fracasso com a vida.
E, se ontem
sentia sede de justiça,
hoje, sem remorsos, estendo o prato
para pedir comida ao algoz
porque tenho fome.
Muita
fome.


(Marcia Pfleger - 21/09/1992)

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Sobre o nome do Blog...


Eu pensei, a princípio, em dar o nome do blog de “Caixa de retalhos”, porque a ideia é uma miscelânea das várias faces que eu, como bom octaedro, poderia colocar, deixando tudo bem variado, colorido, com fitilhos e arremates, rendas, avelórios e paetês.  Depois, refleti que cada “costura” seria antes de ser costura, um corte, uma incisão cirúrgica, algo não epitelial e sim revelador de uma visceralidade , que é o avesso da costura. Assim, desisti em prol de um nome que traduzisse algo que tocasse a todos intimamente e de maneira uníssona. Então, me ocorreu que o gesto de escrever usando as unhas num quadro-negro  é a coisa mais doentia que poderia me imaginar fazendo.  E que nenhum tímpano ficaria imune ao impacto – mesmo aversivo -  que tal gesto suscita. Gostei!  E disso nasceu o nome do blog “Unha que risca a lousa” e, minutos após, o poema abaixo...:

"E tudo que escrevo, escrevo para ferir teus ouvidos, para que sangres, por dentro, de uma lágrima indizível, para que nunca mais esqueças o apito do navio partindo, o quebra-mar em arritmia, as conchas se esfarelando na areia. Tudo que escrevo, escrevo com a ponta de um espinho onde uma borboleta insana pousa. É um giz sem suavidade, uma unha que risca a lousa ".

DA PERIDIOCIDADE DO BLOG:
A proposta deste blog é ter peridiocidade semanal, o que me permite equilibrar o tempo escasso de que disponho à motivação que me faz escrever. Porém, pode ocorrer, em determinada semana, que eu poste mais do que o previsto, em função de estar passando por um surto de criatividade ou por uma histeria motivacional...

Marcia Pfleger

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013


Olá, você por aqui! Seja muito bem-vindo ao blog Unha que Risca a Lousa!
Você vai descobrir um pouco do meu trabalho como escritora e, como é de praxe, chamo a atenção para o cuidado com o conteúdo aqui inserido. Lembro que existe a Lei 9.610, sobre Direitos Autorais, portanto conto com seu respeito e elegância no sentido de evitar plágio e, caso resolva citar os conteúdos deste blog, atento para a importância de manter os referidos créditos da autora.
Após esse preâmbulo...comecemos...
Aí vai um poema meu...para o dia de agora:

Prendo uma palavra tua e perco a lua
Prendo uma palavra tua e perco a lua de onde o lume foge. Meu olhar - horizonte cuja miragem não se altera - é perder-se na espera. O que foi safira está quebrado: lascas de vidro, os restos de um olhar caído... Percebes na noite onde me destilas, que a revoada dos pássaros brancos, frente à lua nua, é um manto a vesti-la ...e depois despi-la? Assim também o teu abraço me cobriu e despiu. Talvez encontres algum dia, nestas ruas, meu olhar como um anel perdido. Prendo as luas das palavras tuas com a língua no céu da boca ...e te beijo nua.

(Márcia Pfleger - escritora)
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